Internacional

A guerra na Ucrânia e a fadiga do Ocidente: o que esperar em 2024?

(Arquivo) Presidente americano, Joe Biden, reúne-se com o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, no Palácio Mariinsky, em Kiev, em 20 fev. 2023 (Crédito: Casa Branca/Adam Schultz)

Por José Késsio Floro Lemos* [Informe OPEU]

Após quase dois anos de intensos confrontos, o conflito na Ucrânia ainda se encontra em um impasse. Não há vislumbres de uma resolução definitiva. Este prolongamento tem gerado crescente exaustão entre os apoiadores ocidentais, fenômeno agravado por dinâmicas geopolíticas em movimento.

Nos Estados Unidos, um debate cada vez mais acalorado, especialmente entre os membros republicanos do Congresso, questiona a sustentabilidade e a necessidade de manter a assistência financeira a Kiev. Esse debate é influenciado por nuances da política interna, tornando-se mais proeminente à medida que as eleições presidenciais e legislativas de novembro de 2024 se aproximam. Simultaneamente, na União Europeia, a resistência de países como Hungria e Eslováquia em fornecer apoio adicional à Ucrânia é notável. O primeiro-ministro eslovaco, Robert Fico, manifestou oposição a um plano de auxílio adicional de 50 bilhões de euros, citando preocupações com a corrupção e questionando a eficácia militar das forças ucranianas.

Arrivals | Mr Robert FICO, Slovakian Prime Minister. | European Council | Flickr(Arquivo) Premiê eslovaco, Robert Fico, chega a encontro do Conselho Europeu, em Bruxelas, em 18 dez. 2014 (Crédito: European Council)

A guerra na Faixa de Gaza também influencia o contexto, potencialmente desviando atenção e recursos inicialmente destinados ao conflito no Leste Europeu. Tal desvio poderia afetar o apoio militar crucial à Ucrânia, fornecido pelos Estados Unidos e pela Europa. Até o momento, o presidente Biden tem se empenhado em manter o apoio a Kiev, adotando uma estratégia que vincula a assistência a Israel ao suporte à Ucrânia, numa tentativa de persuadir o Congresso, incluindo muitos republicanos, a aprovar um novo pacote de apoio financeiro para Kiev. A despeito da fadiga de guerra no Ocidente, EUA e UE ainda evitam pressionar publicamente a Ucrânia para iniciar negociações com a Rússia. Espera-se que a União Europeia disponibilize em breve um financiamento adicional para a Ucrânia, apesar das reservas de alguns Estados-membros.

Entretanto, à medida que 2024 se aproxima, a complexidade política na UE e nos EUA tende a se intensificar, principalmente devido às eleições previstas para junho e novembro, respectivamente. A incerteza política é ampliada pela possibilidade de uma mudança de governo nos EUA em 2025, com a potencial eleição de um presidente republicano, como Donald Trump, ou outro candidato com uma postura mais cética quanto ao apoio à Ucrânia. Isso poderia resultar em uma redução significativa do apoio de Washington, e, influenciada pela mudança na liderança dos EUA, a UE poderia seguir o mesmo caminho, representando um desafio significativo para Kiev.

Diante da potencial escassez de recursos, a Ucrânia pode adotar uma postura militar mais conservadora e defensiva em 2024, focando na proteção de seus territórios atuais ao invés de buscar recuperar territórios perdidos. Esta mudança estratégica pode resultar em um impasse prolongado, com diminuição na intensidade dos combates, mas com a persistência do conflito, mantendo a Ucrânia parcialmente ocupada e em constante necessidade de assistência externa.

A longo prazo, essa situação poderia permitir à Rússia não apenas consolidar seu controle sobre os territórios capturados no leste da Ucrânia, mas também desenvolver sua capacidade militar para ameaçar outras regiões do país por um período prolongado. Caso o apoio ocidental se mostre insuficiente e agrave significativamente a situação da Ucrânia, Kiev poderia ser compelida a iniciar ao menos conversas informais com a Rússia sobre um cessar-fogo. No entanto, mesmo neste cenário alternativo, é altamente improvável que Kiev assine um tratado de paz formal com Moscou no curto ou no médio prazo, dada a relutância em fazer concessões territoriais.

 

* José Késsio Floro Lemos é doutor em Relações Internacionais pelo Programa San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP), pesquisador no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU) e fellow no Instituto Sul-americano de Política e Estratégia (ISAPE). Contato: jkessiolemos@gmail.com.

** Revisão e edição final: Tatiana Teixeira. Recebido em 4 dez. 2023. Este Informe OPEU não reflete, necessariamente, a opinião do OPEU, ou do INCT-INEU.

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