Desvendando motivações: ‘Why We Fight’ revisitado
Soldados da 3ª Divisão de Infantaria sob o comando e controle do V Corpo de exército da Europa e do Exército dos EUA assumem posições de tiro durante uma abordagem inimiga em sua posição no objetivo RAMA, no sul do Iraque, 24 mar. 2003 (Crédito: sargento Igor Paustovski/Flickr)
Por Carolina Weber* [Resenha OPEU]
O documentário “Why We Fight”, ou “Razões para a guerra”, dirigido por Eugene Jarecki (2005), oferece uma perspectiva esclarecedora sobre as motivações por trás do envolvimento dos Estados Unidos na guerra contra o Iraque, em 2003, após os ataques às Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001. Por meio de uma cuidadosa análise cronológica dos eventos que aconteceram antes, durante e depois desse momento crucial, o filme lança luz sobre os fatores que influenciaram as decisões políticas e militares dos EUA.
Além de apresentar uma narrativa histórica detalhada, o documentário inclui entrevistas, depoimentos e explicações que questionam a narrativa oficial dos Estados Unidos, desafiando a noção de que as ações militares foram motivadas pela busca da liberdade e da democracia. Em vez disso, “Why We Fight” sugere que há motivos mais complexos e menos altruístas por trás da política externa estadunidense, revelando uma realidade muitas vezes distante das narrativas propagandísticas do Estado.
O filme traz uma breve contextualização da história militar dos Estados Unidos, com foco especial no período após os eventos do 11/9 e no início dos anos 2000. No entanto, é crucial notar que o processo de militarização nos EUA remonta a períodos anteriores, com marcos significativos como a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que introduziu a noção do Complexo Militar-Industrial, expressão cunhada pelo presidente Dwight D. Eisenhower (1953–1961). Esse conceito sugere que todas as indústrias, independentemente de estarem ligadas à guerra ou não, podem ser mobilizadas para a produção de guerra, fortalecendo, assim, o aparato militar do país.
A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) foi um ponto crucial nesse processo, no qual os esforços industriais estadunidenses desempenharam um papel vital, consolidando o país como uma potência militar, industrial, política e econômica global. A subsequente Guerra Fria (1947-1991) testemunhou a ascensão da União Soviética como uma grande potência rival, levando os EUA a adotarem medidas para conter essa ameaça. Isso incluiu estratégias de colonialismo econômico e imperialismo, evidenciadas em eventos como a Guerra do Vietnã (1959-1975), período em que os EUA estabeleceram bases militares e exerceram influência econômica na região, apesar da oposição popular à guerra e à violência.
No século XXI, o atentado do 11 de Setembro, ocorrido durante a presidência de George W. Bush (2001-2009), marcou uma mudança na percepção popular e no apoio ao discurso governamental. O conceito de “eixo do mal” foi introduzido para descrever os inimigos da nação, justificando assim ações agressivas contra alvos considerados ameaças aos interesses estadunidenses. O documentário sugere que essa retórica já existia antes dos referidos ataques. A resposta dos Estados Unidos foi a Guerra do Iraque (2003). Essa análise histórica oferece uma compreensão mais ampla dos eventos que levaram à guerra no Iraque e das dinâmicas geopolíticas que moldaram a política externa dos EUA.
(Arquivo) Ataque do 11/9, em Nova York (Crédito: Cyril Attias/Flickr)
Ao longo do documentário, testemunhos e depoimentos são apresentados, todos evocando o título “Why We Fight”. Tal fato deixa evidente que a mentalidade da população após os eventos do 11 de Setembro é fundamental para compreender as motivações por trás da guerra. A ideia de um inimigo externo extremamente ameaçador, pronto para invadir o país a qualquer momento, foi legitimada nesse período, colocando em questão quem realmente seria esse inimigo e qual seria o verdadeiro propósito da guerra. A ambiguidade dessas respostas paira no ar, questionando as narrativas oficiais e destacando a necessidade de uma análise mais profunda sobre os motivos que levaram os Estados Unidos a se envolverem em conflitos militares tão significativos.
O documentário “ Why We Fight” oferece uma análise penetrante das motivações por trás do envolvimento dos EUA na guerra contra o Iraque, esclarecendo as complexidades da política externa e as influências históricas que moldaram a mentalidade estadunidense. Enquanto o filme se concentra nos eventos que precederam e sucederam aos ataques do 11/9, sua relevância transcende o período específico, ecoando até os dias de hoje.
No atual cenário dos Estados Unidos, a análise crítica das motivações por trás de intervenções militares continua sendo uma questão de grande importância. Com seu apelo à segurança nacional e à defesa dos valores estadunidenses, a narrativa pós-11 de Setembro, moldou não apenas as políticas externas, mas também a percepção da ameaça externa entre o público nativo.
No entanto, à medida que os EUA enfrentam renovados desafios internos e externos, a necessidade de uma compreensão mais profunda das raízes e consequências das políticas militares se torna cada vez mais urgente. A revisão crítica dos eventos históricos, como a Guerra do Iraque, ilumina não apenas as decisões do passado, mas também oferece insights valiosos para orientar o futuro da política externa do país.
Nesse sentido, “Why We Fight” serve como um lembrete poderoso da importância de se questionar narrativas oficiais e de buscar uma compreensão mais completa das forças que impulsionam a política externa de uma nação. Em um mundo marcado por desafios complexos e ameaças em evolução, a reflexão sobre as lições do passado continua sendo essencial para forjar um caminho rumo a um futuro mais seguro e justo.
* Carolina Weber é bolsista de Iniciação Científica do INCT-INEU/OPEU (PIBIC-CNPq), graduanda em Defesa e Gestão Estratégica Internacional do Instituto de Relações Internacionais e Defesa (IRID/UFRJ). No OPEU, cobre a área de Meio Ambiente e Energia dos EUA e faz parte da equipe do Instagram. Contato: carolinaweberds@gmail.com.
** Texto escrito como parte da avaliação proposta pela disciplina obrigatória de “Introdução ao Estudo de Defesa”, ofertada em 2021 pelo professor do IRID/UFRJ Henrique Paiva. Primeira revisão: Simone Go6ndim. Contato: simone.gondim.jornalista@gmail.com. Segunda revisão e edição final: Tatiana Teixeira. Primeira versão recebida em 8 mar. 2024. Esta Resenha não reflete, necessariamente, a opinião do OPEU, ou do INCT-INEU.
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