Política Doméstica

Mais do que uma sex tape: Fox News, NBC News e as disputas narrativas 

Matéria da Fox News sobre o escândalo (Fonte: Fox News)

Por Danilo Faustino*

Staff Directory | School of Journalism and Communication

Profª Andra Brichacek (Fonte: University of Oregon)

Em um artigo publicado pela University of Oregon, a pesquisadora Andra Brichacek procura analisar, usando o ano de 2016 como base, a influência da mídia em eleições. Para a professora, a parcialidade midiática faz uso de scripts durante suas interpretações de acontecimentos. Brichacek, citando sua entrevista com a pesquisadora Regina Lawrence, usa como exemplo a forma como o democrata Al Gore era retratado como um “chato pomposo” e que seu concorrente, o republicano George W. Bush, “não era inteligente”.

Com a aproximação de mais uma eleição presidencial nos Estados Unidos, é importante que os meios de comunicação sejam analisados com ainda mais cautela. Nas últimas semanas, o Senado foi palco de uma nova polêmica que levou a uma troca de acusações entre dois grandes veículos do setor: a Fox News e NBC News. Aqui, vamos analisar como a divulgação de uma sex tape se tornou uma disputa narrativa e pode se encaixar nas dinâmicas para as eleições.

A sex tape e a divulgação

No dia 15 de dezembro, o jornal conservador Daily Caller publicou uma matéria divulgando um vídeo, no qual um assessor de um membro do Senado (até então não nomeado diretamente pelo veículo) praticava atos sexuais com outro homem na sala de audiências identificada como a Hart 216. A sala é famosa por ter recebido as sabatinas de juízes da Suprema Corte e os trabalhos da Comissão Nacional que tratou dos ataques do 11/9. Apesar de esconder o rosto do assessor no vídeo, o site incorporou na matéria uma postagem na rede social X (ex-Twitter) que ligava o funcionário ao senador Ben Cardin (D-MD). O post foi divulgado (imagem abaixo) pelo representante Mike Collins (R-GA), crítico frequente de questões envolvendo pautas mais progressistas.

Daily Caller Senate Gay Sex Snippet | Senate Hearing Room Gay Porn Incident  | Know Your Meme

Fonte: site Know Your Meme

Ainda no dia 15, Aidan Maese-Czeropski publicou no LinkedIn um texto curto, em que se dizia perseguido por questões políticas, que amava seu emprego e nunca desrespeitaria o local de trabalho. No sábado (16), porém, a equipe de Ben Cardin disse ao site Politico que Aidan não fazia mais parte de seu quadro de funcionários. O motivo da demissão não foi divulgado, e a declaração afirmava que não haveria comentários sobre o caso. O então funcionário apagou a conta na rede social citada, mas a NBC News transcreveu a publicação de Maese-Czeropski na reportagem.

A acusação da NBC News e a resposta da Fox News

Diante da repercussão do vídeo, a NBC News publicou uma matéria que acusava os meios de comunicação conservadores de exporem o nome do então funcionário. Os jornalistas da NBC explicam os acontecimentos, tal como a declaração de Cardin ao Politico, e identificam a reportagem do jornal Washington Examiner como uma das fontes do vazamento do nome de Maese-Czeropki. O Washington Examiner se autointitula uma plataforma de notícias políticas e análises conservadoras.

A emissora de televisão Fox News, que se define como uma fonte alternativa aos veículos “de esquerda”, postou uma matéria em resposta à reportagem da NBC em seu site. Já no início, a jornalista Lindsay Kornick chama a manchete do jornal concorrente de “ridícula”, afirmando que, em nenhum momento, a Fox News identificou o assessor. Para sustentar seu argumento contra o veículo, a Fox News mostrou tuítes de figuras republicanas e conservadoras. Tim Murtaugh, diretor de Comunicação da campanha de Donald Trump em 2020, postou que a abordagem da NBC News era “ultrajante e pertencia ao Hall da Fama das parcialidades da mídia”. Richard Grenell, embaixador estadunidense que serviu em Berlim durante o governo Trump, acusou a NBC de estar trabalhando para os democratas.

A NBC News não respondeu a Fox quanto a essa questão, mas a disputa narrativa entre os dois veículos não é novidade.

Uma disputa narrativa de anos

Em 2023, o jornal The New York Times publicou uma matéria, relatando como a Fox News e a NBC News fizeram a cobertura de “gafes” cometidas por jornalistas de ambos os veículos no contexto da guerra do Iraque. Na época, a Fox fez uma cobertura sobre a entrevista de Peter Arnett para uma emissora estatal iraquiana, na qual dizia que os planos estadunidenses para a guerra haviam fracassado. O caso resultou na demissão de Arnett, vencedor do Prêmio Pulitzer.

Peter Arnett at CNN Broadcasts the First Live Television Coverage of War :  History of Information(Arquivo) Arnett transmitiu durante a Guerra do Golfo, pela CNN, a primeira cobertura ao vivo na televisão de um conflito dessa envergadura (Fonte: History of Information)

Dias depois, a MSNBC noticiou que o repórter Geraldo Rivera, antigo funcionário da emissora, havia sido expulso do Iraque pelo Pentágono, após identificar em rede nacional a localização das tropas estadunidenses. Segundo uma reportagem da CBS relatando a situação de Rivera, o repórter mandou um relatório via satélite, dizendo que estava longe de Bagdá e que os jornalistas da NBC estariam divulgando mentiras sobre ele. Além disso, Geraldo teria dito que: “Me parece que alguns ratos da minha antiga rede estão espalhando mentiras sobre mim. Não conseguem competir de forma justa no campo de batalha, por isso estão tentando me apunhalar pelas costas. Não é a primeira vez”.

Durante a eleição presidencial de 2020, o New York Times fez uma análise sobre como as emissoras de televisão por assinatura, entre elas o grupo NBCUniversal e a Fox News, cobriram o Dia da Eleição. Para o jornal, a Fox News fez sua cobertura com base em dados próprios, com projeções ousadas e de teor pró-Trump. Já os jornais da MSNBC se mostraram mais “sóbrios”, porém com um tom negativo quando falavam sobre movimentações a favor do então presidente. Na MSNBC, durante a madrugada, os comentaristas apontaram para uma garrafa de bebida que eles pretendiam abrir quando Biden fosse eleito.

Com a proximidade das eleições gerais de 2024 e diante das últimas notícias políticas, como a possível ausência do nome de Donald Trump nas cédulas do Colorado, os jornais têm-se movimentado cada vez mais para influenciar seus leitores e espectadores. Em uma olhada no site da Fox News, é possível perceber que grande parte das matérias na categoria “Política” adota um tom de crítica à “esquerda” e aos democratas. Já as reportagens na página on-line da NBC News na mesma categoria estão voltadas para opinar sobre o comportamento de Trump e dos republicanos.

Os números das audiências para as emissoras nos Estados Unidos em 2023 mostram que ambos os grupos estão bem posicionados para levar sua mensagem para milhares de lares estadunidenses. Segundo o ranking divulgado pela Variety Magazine, o grupo Fox e o grupo NBCUniversal ocupam duas posições cada no top 10. A NBCUniversal está em primeiro (NBC) e oitavo lugar (MSNBC), com um número médio de 4,537 milhões e 1,22 milhão de telespectadores, respectivamente. Já o grupo Fox esteve na quarta (Fox) e quinta (Fox News) posição com uma média de 3,353 milhões e 1,899 milhão de espectadores, respectivamente.

 

* Danilo Faustino é pesquisador bolsista de Iniciação Científica do INCT-INEU/OPEU (PIBIC-CNPq) e graduando em Relações Internacionais do Instituto de Relações Internacionais e Defesa (IRID/UFRJ). Pesquisa cultura, cinema, educação e sociedade e integra a equipe responsável pela conta do OPEU na rede X (ex-Twitter). Contato: danilo.faustino@ufrj.br.

** Primeira versão recebida em 22 dez. 2023. Este Informe OPEU não reflete, necessariamente, a opinião do OPEU, ou do INCT-INEU.

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