China e Rússia

Acordo Brasil/EUA e leilão 5g: Bolsonaro entre pressões domésticas e tensões EUA/China

Presidente Jair Bolsonaro durante encontro com o conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Robert O’Brien (Crédito: Marcos Corrêa/PR)

Por Edna Aparecida da Silva*

No último dia 19 de outubro, o governo brasileiro assinou um protocolo sobre regras comerciais e transparência com os Estados Unidos, que visa a ampliar o comércio bilateral e os fluxos de investimento entre os dois países. Embora não trate de questões substanciais, já que se refere a acordos não-tarifários com anexos sobre facilitação de comércio e administração aduaneira, boas práticas regulatórias e anticorrupção, faz parte da agenda de harmonização regulatória e das reformas, entre elas a tributária, para a adesão do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No entanto, foi objeto de especial atenção no cenário político, porque ocorre em um momento de incertezas a respeito da decisão do Brasil sobre a participação da chinesa Huawei no fornecimento de equipamentos de telefonia 5g e das eleições nos EUA.

Como explicou o ministro das Comunicações, Fábio Faria, o leilão de cinco blocos de frequência 5g deverá ocorrer em 2021, e a decisão sobre os fornecedores de equipamentos caberá ao presidente. Ou seja, em vez de as operadoras de telefonia escolherem seus fornecedores de equipamentos, como a sueca Ericsson, a finlandesa Nokia, a coreana Samsung, ou a Huawei, o governo é que vai decidir se exclui a empresa chinesa, cedendo às pressões dos EUA, como já o fizeram Reino Unido e outros aliados.

O tema é sensível porque, ao lado da importância das relações econômicas e de cooperação com a China entre outras razões, a Huawei está no país há mais de 20 anos, e as operadoras de telefonia celular, Vivo, Claro, Tim e OI já utilizam seus equipamentos. Soma-se a isso o fato de a empresa ter dois centros fabris no país, Manaus e Sorocaba, com 1.200 funcionários, além de gerar mais de 15.000 empregos indiretos, segundo o CEO da empresa no Brasil, Sun Baocheng.

É importante destacar que, embora os acordos tenham sido assinados em uma cerimônia virtual entre o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o representante de Comércio americano (USTR, na sigla em inglês), Robert Lighthizer, o governo brasileiro também recebeu, nos dias 19 e 20 de outubro, uma delegação liderada pelo conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Robert O’Brien e composta de integrantes do CSN, do vice-representante de Comércio dos EUA, Michael Nemelka, da presidente do Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos da América (EximBank), Kimberly Reed, e da diretora da Corporação de Desenvolvimento Financeiro dos Estados Unidos, Sabrina H. Teichman.

A delegação se reuniu com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e com membros de alto escalão do governo brasileiro, como o ministro Paulo Guedes e o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Augusto Heleno, segundo nota do Itamaraty, para tratar de relações bilaterais e discutir questões regionais e internacionais. A presença de O’Brien mostra que a agenda esteve centrada nos temas de segurança e política externa dos EUA.

Essas tratativas produziram um memorando de entendimentos, divulgado em 20 de outubro, pelo qual o Brasil poderá receber de US$ 1 bilhão em créditos para financiamento de investimentos pequenas e médias empresas. Esses recursos serão destinados ao BTG Pactual, Itaú e Smart Rio, por meio de agências de fomento dos EUA, entre elas a Corporação Financeira de Desenvolvimento Internacional (IDFC, na sigla em inglês). A nova agência deverá financiar “não só produtos americanos, ou empresas dos EUA que fazem investimentos no exterior, mas projetos de interesse dos EUA e dos nossos aliados”, como explicou Todd Chapman, o embaixador dos EUA no Brasil em entrevista ao jornal O Globo.

Todd Chapman
Bolsonaro e o embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman, em 7 abr. 2020 (Crédito: Alan Santos/PR/Getty Images)

Assim, o IDFC quer financiar a compra de equipamentos de telecomunicações das europeias Ericsson e Nokia, para substituir os equipamentos da Huawei já instalados no Brasil. Embora não esteja claro por que os recursos serão canalizados para essas instituições especificamente, cabe lembrar que o BTG e o Itaú fazem parte do grupo de 22 agentes financeiros cadastrados no Programa Emergencial de Acesso a Crédito (PEAC) do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O PEAC vai oferecer garantias de 80% nos empréstimos e financiamentos a pequenas e médias empresas, no âmbito do Fundo Garantidor para Investimentos (FGI), de recursos do BNDES, ou de outras fontes.

5g é questão de segurança nacional para os EUA

Inicialmente programado para 2019, o leilão vem sendo adiado. Desde então, os EUA tentam convencer o governo brasileiro dos “perigos de segurança nacional” envolvidos na participação da empresa chinesa nos serviços de Internet 5g, como espionagem e roubo de segredos de propriedade intelectual. A proteção da propriedade intelectual é um dos temas cruciais da agenda norte-americana, como reconheceu o embaixador Chapman, acrescentando que “a maior exportação dos EUA é Inteligência, propriedade intelectual”. Logo, a mensagem é clara: os aliados e parceiros que quiserem aprofundar relações econômicas precisam ter em conta suas preocupações com segurança.

O argumento dos funcionários de Inteligência norte-americana para convencer aliados a excluírem a Huawei é que, por meio das chamadas “backdoors”, que são portas de acesso nas redes de telefonia móvel, ela pode ter acesso à informação que circulará na rede, dados pessoais, corporativos e governamentais. Ou seja, a questão não é o que os chineses estão fazendo, mas o que têm capacidade tecnológica para fazer, devido à sua dianteira nos setores de Inteligência Artificial e de Telecomunicações.

Em 9 e 10 de outubro de 2019, especialistas vieram ao Brasil para apresentar o Comitê de Investimento Estrangeiro dos Estados Unidos (CFIUS, na sigla em inglês) para a Casa Civil, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e os Ministérios das Relações Exteriores e de Ciência e Tecnologia, em um esforço para convencer o governo a adotar um “CFIUS brasileiro”. Painel interagências liderado pelo Departamento do Tesouro americano, o CFIUS tem autoridade para revisar e sugerir ao presidente o bloqueio de investimento nos setores classificados como sensíveis e de infraestrutura crítica que possam afetar a segurança nacional dos EUA.

Segundo a Foreign Investment Review Reform Act (FIRRMA), lei aprovada com apoio bipartidário em 2018 e que reformou a legislação de segurança de investimento estrangeiro, o CFIUS, além de seu papel doméstico, também deve atuar no plano internacional, buscando a cooperação de parceiros e aliados com seus objetivos de segurança em troca de acesso a mercados e isenções das regulações restritivas. Ao mesmo tempo, deve estimular a adoção de legislação e de regulações de segurança similares ao CFIUS.

No pano de fundo dessa decisão a ser tomada pelo governo brasileiro, estão as tensões geopolíticas entre Estado Unidos e China, relativas à disputa pela manutenção da liderança tecnológica dos EUA, e as iniciativas do governo norte-americano para banir a participação da Huawei na infraestrutura de telecomunicações 5g de seus parceiros e aliados. Entre estes, Reino Unido, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Índia e Japão, que já restringiram a Huawei e adotaram legislação de segurança de investimento nos moldes do CFIUS.

A exclusão da Huawei é parte de uma estratégia global para a contenção da participação chinesa nos setores de tecnologias sensíveis, emergentes e fundacionais, conceitos das novas regulações de segurança nos EUA, e que também atinge outras líderes globais, como a ZTE, a Bytedance (TikTok), Tencent (WeChat) e agora também a Ant Group, do Alibaba Holding Group, no setor de serviços financeiros. O Alipay é uma plataforma de pagamentos do Ant Group, utilizada por chineses com contas em renminbi para pagamentos nos EUA. O Departamento de Estado propôs ao presidente Trump colocar o grupo na lista negativa de comércio.

Nesse cenário, os acordos e as declarações do governo sinalizam a disposição do governo brasileiro em aprofundar seu alinhamento geopolítico com os EUA e alimentam as incertezas e preocupações do setor privado e das associações empresariais sobre as relações com a China. Foi o que se viu nos discursos do presidente e de seu ministro das Relações Exteriores, salientando as relações entre sistemas econômicos e regime políticos, democracias e economia de mercado, como critério para relações econômicas e de investimentos.

“No último ano e meio, junto com o presidente Trump, elevamos as relações Brasil-EUA ao seu melhor momento, e abriu-se um novo capítulo no relacionamento entre as duas maiores economias e democracias do hemisfério”. Foi assim que o presidente Jair Bolsonaro anunciou, segundo matéria da Reuters, os acordos na conferência virtual de negócios, a US-Brazil Connect Summit, organizada pela Câmara de Comércio dos EUA. No evento, Bolsonaro também destacou as oportunidades de negócios que se abrirão no país, no setor de gás natural, biocombustíveis e a Carteira de Negócios do Programa de Parcerias de Investimento (PPI). O chanceler Ernesto Araújo declarou, por sua vez, que “Não há economia de mercado separada de democracia”, acompanhando observações do secretário de Estado americano, Mike Pompeo, sobre a relação entre segurança e comércio.

Essas declarações ecoam as posições anti-China norte-americanas, como a da Heritage Foundation, um think tank conservador, para o qual os investimentos chineses são “capital corrosivo”. Assim como seus projetos de cooperação econômica, afirma a Heritage, “dirigidos pelo poder autoritário do Partido Comunista Chinês”, minam o Estado de Direito e a liberdade econômica e seriam, portanto, uma ameaça à democracia. Essas ideias sugerem a restrição de relações econômicas e cooperação com a China como questão política e de segurança. É nesse campo que as pressões sobre os aliados têm sido formuladas.

Essa sinalização tem gerado preocupações e fomentado o debate sobre os impactos que uma decisão sobre a Huawei poderá ter para as relações com EUA e com a China e como isso afetará a inserção internacional do Brasil. Segundo o vice-presidente Hamilton Mourão, o Brasil não deverá restringir a participação de empresas de qualquer país e observará critérios de segurança e econômicos, trazendo para o debate o custo de exclusão da Huawei. Em entrevista à Xinhua, agência de notícias oficial do governo chinês, o vice-presidente declarou: “não distinguimos as empresas pelo país de origem, mas sim por sua capacidade em oferecer produtos e serviços confiáveis, seguros e, obviamente, a preços competitivos”.

No debate, a equidistância tem sido vista como a posição mais adequada, a que melhor traduz o desejo, ou a expectativa, de setores do governo e frações do empresariado brasileiro, financeiro, agroexportador e de infraestrutura, de se beneficiarem das estratégias geopolíticas dos dois gigantes. É o caso dos recursos para a América Latina do América Cresce, programa dos EUA que busca reduzir a influência chinesa na região por meio do financiamento de projetos em infraestrutura, energia e mineração, e dos programas de cooperação e investimento da China.

Mas esse ponto de vista encontra duas expressões. Uma, que tem sido vocalizada pelo vice-presidente Hamilton Mourão, com eco na imprensa corporativa, vê a decisão como uma questão comercial, e não ideológica. Outra vê o não alinhamento pragmático como alternativa para evitar um curso de colisão com as duas principais economias globais e os interesses do setor privado brasileiro, chinês e norte-americano. Enquanto a primeira tenta definir os termos do debate para setores do próprio governo e justificar uma decisão que confronta a visão dos EUA sobre o tema, a segunda sugere uma via política para construção de um lugar, de onde se possa dialogar sem tensionar as relações com seus dois principais parceiros econômicos.

EUA: ‘seleção de fornecedor 5g não é, para nós, uma questão comercial’

No entanto, é importante ressaltar o significado da exclusão da Huawei na agenda do Estado americano. A seleção de fornecedores do 5g é um assunto de segurança nacional, não uma questão comercial, como explicou o embaixador Todd Chapman, em entrevista ao jornal O Globo. O argumento dos EUA é que a Huawei criaria um ambiente de insegurança, porque os dados privados e corporativos estariam ao alcance dos serviços de Inteligência da China, como previsto pela lei de segurança nacional chinesa.

Analistas questionam essa justificativa, que consideram frágil, já que os próprios EUA fazem espionagem e monitoram dados de celulares, tablets e até smart tvs, como revelaram Julien Assange e Edward Snowden, em denúncia sobre a atividade da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês). Porém, o que está em questão é que, agora, a China pode fazer o mesmo, devido à sua vantagem relativa em setores de tecnologia de ponta – o que é um problema para os EUA. E dizer que os EUA também fazem isso certamente não agregará elementos para a posição do Brasil.

Três aspectos são importantes para aquilatar a relevância do tema para os EUA e traduzem a dificuldade da posição do Brasil. A decisão, seja qual for, pode gerar problemas que não serão resolvidos facilmente com uma piada, uma palavra de baixo calão, uma live, ou um tuíte, como tem sido a prática corrente do governo no trato de assuntos de Estado.

Em relação à presença da Huawei na rede 5g, embora o embaixador americano negue retaliações, ele alerta que os empresários podem não querer investir, devido ao clima de insegurança. Cabe lembrar que o DFC é quem vai financiar o investimento privado norte-americano na América Latina. Desde o Pós-Guerra, a expansão de negócios privados está articulada aos objetivos da política externa dos EUA. Esse é o papel das agências que atuam na coordenação, no direcionamento e na definição de condicionalidades para o financiamento e a securitização do investidor privado americano, que, por sua vez, como mostra Kenneth A. Rodman no livro “Sanctions Beyond Borders”, cooperam com os objetivos de política internacional econômica do Estado americano.

Isso atinge diretamente os interesses brasileiros, pois as reformas que estão na ordem do dia do governo Bolsonaro e os acordos para cooperação regulatória visam a atrair investimento americanos para o Brasil, como aponta o relatório “Comércio e Investimento Brasil/EUA Aprofundando as Relações Econômicas Bilaterais”, da Apex/Atlantic Council.

Outro aspecto diz respeito à disputa tecnológica, que envolve controle de mercados, a definição de padrões tecnológicos e sua interface com questões estratégico-militares. Apesar da dependência de importação de semicondutores, foco das retaliações comerciais do EUA contra a Huawei, a China avançou em setores como Inteligência Artificial, rede 5g e corrida espacial, tecnologias duais de aplicação civil e militar. Em junho, os chineses completaram o Beidou, seu sistema de navegação por satélite, que rivaliza com o GPS dos EUA. Além do aspecto militar, a Inteligência Artificial e o 5g estão na base de inovações, como as plataformas de negócios e serviços digitais, comércio e serviços financeiros (WeChat/Alibaba e AliPay/Ant Group), entretenimento (TikTok) e jogos (Tencent), e os serviços e produtos da Huawei no setor 5g.

Último satélite do Sistema de Navegação de Satélite Beidou é lançado do Centro de Lançamento de Satélites na província de Sichuan, em 30 jun. 2020 (Crédito: Yin Gang/China Daily)

A competição por mercados para inovação e serviços digitais envolve a extensão da estrutura do setor de telecomunicações e tem uma dimensão física que se expressa no alcance de maior número de usuários, estações, antenas e telefones, pelos quais serão definidos os padrões tecnológicos. Ou seja, o número de países e de usuários da rede também é um aspecto da disputa entre EUA e China na rede 5g.

E, do ponto de vista político, a proteção dos setores “tecnologia, informação, dados” (TID business) se articula com o “Economic security is national security”, presente na Estratégia de Segurança Nacional de Trump. As novas regulações do CFIUS e do Export Control Act (ECRA), aprovados como consenso bipartidário em 2018, colocaram dezenas de setores econômicos sob o foco da relação investimento e segurança. Isso significa uma diretriz para proteção de mercados e preservação de posições de liderança tecnológica dos EUA, inscritas no campo de exceções de segurança. Não são, portanto, tratadas como questão “comercial”, ou “de mercado”.

Cabe ressaltar, além desses três pontos, que as tensões com a China no campo tecnológico e as ações para limitar a competição chinesa nos negócios privados de setores sensíveis estão assentadas em um consenso bipartidário, e o desfecho eleitoral (Biden, ou Trump) não deve alterar o núcleo duro desse embate.

Tensões EUA/China: a alternativa do não alinhamento

O não alinhamento pragmático é outra posição que vem sendo defendida no debate político e acadêmico sobre as relações do Brasil com EUA/China. A perspectiva de uma parcela do setor empresarial (como no caso da Confederação Nacional da Indústria e da AmCham Brasil) é a de que o alinhamento do governo com os EUA favorece o aprofundamento das relações econômicas. Há, porém, frações do empresariado, como diplomatas com negócios na China, entre outros, preocupados com essa decisão, como tem sido apontado pelo Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC). Na Carta Brasil-China, uma publicação da entidade, ressalta-se a importância crescente da China na economia global e como parceiro de comércio e investimento do Brasil. Para a diretora-executiva do CEBC, Claudia Trevisan: “Mesmo em um contexto de rivalidade a longo prazo, interdependência econômica e tecnológica demandará coexistência pragmática entre as duas potências. Brasil deve ter cautela e evitar escolher lados”.

Essa posição coloca em tela a necessidade de negociação com EUA e China, no sentido de buscar, com base no diálogo com seus principais parceiros, um espaço para sua própria agenda, mais do que a afirmação de como o Brasil deve tratar a questão.

Até agora, o alinhamento automático e os acordos com os EUA não têm gerado benefícios imediatos para o Brasil. As contrapartidas norte-americanas têm sido de apontar alguma vantagem no futuro, condicionada a mais concessões por parte do país – um modus operandi que se verifica nos vários acordos estabelecidos com os EUA, como o acordo militar e a imposição de tarifas sobre a importação de alumínio.

Como revela a análise de Rebeca Ray “The Panda’s Pawprint: The Environmental Impact of the China-led Re-Primarization in Latin America and the Caribbean”, as relações com a China não escapam à mesma consideração e envolvem outras questões, como o impacto ambiental e as implicações para segurança alimentar, temas críticos que vão muito além da agenda corporativa.

É preciso destacar que a cooperação com os EUA para o bloqueio da Huawei, como previsto na regulação do CFIUS, envolve a negociação de isenções das revisões de segurança de investimento para os países aliados.

No âmbito das relações EUA/China, apesar das tensões, as pressões dos EUA têm sido por mais acesso ao mercado chinês. Este ano, entrou em vigência a nova legislação de investimento da China, com disposições que foram vistas como uma “melhora do ambiente de negócios”. Essas mudanças favoreceram a abertura do setor financeiro da China, como o mercado de pagamentos com cartões de crédito. A American Express foi autorizada a operar em moeda local, seguida de outras como o PayPal, Goldman Sachs, JP Morgan, Fitch Ratings e S&P Global. As várias dimensões das relações EUA-China expressam a complexidade do cenário, que envolve disputa tecnológica e rivalidade estratégica e uma concertação de interesses, como revelam suas relações bilaterais e o acordo comercial.

Bolsonaro e a escolha da subalternidade

O não alinhamento não é, contudo, uma escolha unilateral, e sim resultado de uma construção política que dependerá da capacidade do governo de negociar com os EUA. Essa tarefa exigiria a consideração do interesse nacional, o que não se restringe aos interesses do setor privado, e colocar em pauta o diálogo e a aproximação com parceiros regionais.

Apesar da incerteza quanto ao cenário que deverá se configurar com o resultado das eleições, o posicionamento do Brasil em relação à questão da Huawei esbarra em dificuldades, como a envergadura da temática tecnológica na política externa dos EUA, a dimensão política da projeção global chinesa, em particular na América Latina, e a limitada, ou inexistente, capacidade política do atual governo brasileiro de formular um projeto nacional e uma estratégia de inserção internacional para o Brasil. Nesse quadro, o país segue sendo confrontado pelas consequências do abandono da política de autonomia, um dos traços históricos da política externa brasileira.

 

* Edna Aparecida da Silva é professora da FFC/UNESP e pesquisadora do INCT-INEU. Estuda a relação entre investimento e segurança nos EUA, com foco sobre Comitê de Investimento Estrangeiro dos Estados Unidos (CFIUS), trajetória e atuação doméstica e internacional no governo Trump. Contato: ednasilva@ineu.org.br.

** Recebido em 2 nov. 2020. Este Informe não reflete, necessariamente, a opinião do OPEU, ou do INCT-INEU.

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