Semana turbulenta para as táticas comerciais de Trump coloca o mundo sob tensão
por Andrew Mayeda
Traduzido de Bloomberg*
No espaço de cinco dias, os Estados Unidos cancelaram uma guerra comercial com a China, lançaram dúvidas sobre a estrutura das negociações com Pequim e ameaçaram as tarifas sobre as importações de carros e caminhões para proteger a segurança nacional.
Em outras palavras, foi apenas mais uma semana para a política comercial volátil do presidente Donald Trump. Os próximos dias não parecem ser muito mais calmos.
O secretário de Comércio, Wilbur Ross, deve visitar a China entre 2 e 4 de junho para mais conversas com o vice-primeiro-ministro Liu He, com uma longa lista de tópicos que podem aliviar as tensões com Pequim ou aumentá-las novamente – desde reduzir o déficit comercial até o destino da ZTE, gigante de telecomunicações chinesa.
Em seu segundo ano no cargo, Trump tem trabalhado na missão de cumprir sua promessa eleitoral sobre reprimir práticas comerciais injustas de países estrangeiros e reconstruir a base de produção dos Estados Unidos. O escopo das propostas comerciais do presidente tem variado, desde a revisão do Acordo de Livre Comércio da América do Norte à proposta de tarifas de até US$ 150 bilhões em importações chinesas. Na quarta-feira, o governo Trump abriu nova frente, lançando uma investigação para saber se as importações de automóveis ameaçam a segurança nacional.
Enquanto isso, as isenções de tarifas sobre metais para a União Europeia (UE), Canadá e México expiram em 1º de junho. Se os Estados Unidos impuserem impostos permanentes, a UE ameaça retaliar com impostos sobre produtos americanos icônicos, como as motocicletas Harley Davidson e o bourbon de Kentucky.
Exclusões Temporárias
Ainda assim, Trump não cumpriu suas piores ameaças. Enquanto seu governo impôs impostos sobre aço e alumínio estrangeiros, também concedeu exclusões temporárias para alguns aliados. Os Estados Unidos não cobraram tarifas importantes sobre produtos chineses. O NAFTA permanece intacto, e poderá levar meses até que o Departamento de Comércio conclua a revisão do setor automotivo.
As ameaças comerciais do presidente causaram problemas no mercado, mas o impacto econômico foi limitado. Com problemas em mercados emergentes, como a Argentina e a Turquia, a melhor alta da economia global em anos parece mais vulnerável. O crescimento do comércio está superando o econômico, retrocedendo ao período antes da crise financeira, mas o Fundo Monetário Internacional segue cada vez mais cauteloso quanto às ameaças protecionistas.
Outras economias asiáticas sofrerão mais do que a China se Trump cumprir as ameaças de aplicar US$ 150 bilhões em tarifas sobre os embarques da maior nação comercial do mundo, segundo os economistas da Bloomberg, Fielding Chen e Tom Orlik. Eles estimam que para cada queda de 10% nas exportações da China, a taxa de crescimento das economias asiáticas cairia 1,1 ponto percentual na média, enquanto a da China diminuiria apenas 0,3 ponto percentual.
“Trump tem uma abordagem que ainda não deu muitos frutos, que é liderar com essas várias ameaças tarifárias e esperar que isso incline as negociações em favor dos Estados Unidos”, disse Edward Alden, membro sênior do Council on Foreign Relations.
O resultado mais notável da estratégia foi um acordo de princípios sobre a atualização do acordo comercial dos Estados Unidos com a Coreia do Sul. Seul aumentou o acesso ao mercado para os carros americanos, mas especialistas em comércio chamaram as mudanças de incrementais. “É uma colheita bastante modesta”, disse Alden. Ele (Trump) também retirou os Estados Unidos de um acordo comercial na Ásia-Pacífico que o Congresso ainda não havia aprovado.
A abordagem de Trump pode se resumir ao simples fato de ele favorecer as tarifas como ferramenta política, disse Phil Levy, membro sênior do Chicago Council on Global Affairs e ex-economista sênior para comércio do Conselho de Assessores Econômicos do presidente George W. Bush.
O governo não parece ter previsto totalmente as consequências das tarifas, como a ânsia dos países em retaliar e a complexidade do relacionamento econômico dos Estados Unidos com a China, disse Levy. “Ele continua terminando em becos sem saída”, disse ele.
Campeão Industrial
Enquanto isso, a China está considerando encorajar montadoras estatais a trazer automotivas privadas como investidoras, à medida que tenta criar uma campeã industrial para competir com empresas globais como Toyota Motor e Volkswagen, segundo pessoas com conhecimento direto sobre o assunto. Um documento político delineando a proposta está sendo estudado por departamentos do governo, disseram as pessoas, que pediram para não ser identificadas.
Certamente, os riscos da provocação de Trump não devem ser ignorados. A ameaça das tarifas de automóveis, somadas a impostos sobre aço e alumínio, aumenta as incertezas que podem afetar os planos de gastos das empresas canadenses e, potencialmente, a decisão do Banco do Canadá sobre juros, disse o economista-chefe do CIBC, Avery Shenfeld.
Relações tensas
Na quinta-feira, o Banco Central Europeu apontou o protecionismo como uma fonte importante de incerteza para a economia da zona do euro, dizendo que o risco “tornou-se mais proeminente e requer monitoramento”. No longo prazo, as relações dos Estados Unidos com alguns de seus aliados mais próximos podem estar em jogo. A ameaça das tarifas sobre carros só complicará a relação já tensa do governo Trump com a União Europeia, que pressionou contra as siderúrgicas americanas.
“Os europeus e outros, tendo visto como as negociações ocorreram em outras situações, vão levar isso em conta para negociar nesse contexto”, disse Rod Hunter, sócio do escritório de advocacia Baker McKenzie e ex-conselheiro sênior do Escritório de Representação Comercial dos Estados Unidos. “O comércio internacional é um jogo de repetição. As pessoas aprendem, e é por isso que a credibilidade é importante”.
Há também a ameaça à ordem comercial global que os EUA ajudaram a construir após a Segunda Guerra Mundial. Os países membros da Organização Mundial do Comércio estão autorizados a tomar medidas de acordo com seus “interesses essenciais de segurança”. Os governos geralmente evitam invocar essa cláusula, mas isso pode mudar com Trump. “Se abrirmos a caixa de Pandora para países que invoquem a segurança nacional como forma de abandonar suas obrigações comerciais, minha sensação é que vamos nos encontrar em uma posição muito difícil quanto a outros países fecharem seus mercados aos nossos produtos”, disse o ex-representante comercial dos Estados Unidos, Michael Froman, em entrevista à Bloomberg Television.
– Com a contribuição de Emily Chang
Tradução por Solange Reis
* Artigo originalmente publicado em 25/05/2018, em https://www.bloomberg.com/news/articles/2018-05-24/turbulent-week-for-trump-s-trade-tactics-puts-the-world-on-edge