Orçamento-tampão encerra paralisia e eleva gastos em US$ 300 bi
por Tatiana Teixeira
Após horas de negociações e com muita briga sobre o aumento do déficit nas contas públicas, em 9 de fevereiro, chegou à mesa do presidente Donald Trump o acordo orçamentário bipartidário que pôs fim à segunda paralisia parcial do governo federal de 2018. Depois de aprovado às pressas no Senado por 71 a 28, o texto foi encaminhado para a Câmara de Representantes, onde passou por 240 a 186, com a oposição da maioria dos democratas, insatisfeitos com a ausência de um compromisso na questão migratória – mais especificamente, sobre o programa Deferred Action for Childhood Arrivals (Daca, ou Ação Diferida para Chegadas na Infância).
Embora no Congresso o clima tenha sido de comemoração com a superação desse impasse, o alívio é apenas temporário. Não há nenhum indício de que a polarização política (inter e intrapartidária) cada vez mais intensa vá ceder em Washington, nem de que a relação entre Executivo e Legislativo possa melhorar no curto prazo.
Reforço bilionário na Defesa
“Acabei de assinar o projeto de lei. Nossas Forças Armadas agora vão ser mais fortes do que nunca. Nós amamos e precisamos das nossas Forças Armadas e demos tudo para elas — e mais. Primeira vez que isso acontece em um longo tempo. Isso também significa EMPREGOS, EMPREGOS, EMPREGOS!”, tuitou um eufórico Trump, ao anunciar a sanção do acordo do orçamento-tampão de dois anos.
O texto autoriza um vultoso aumento nos gastos, sobretudo, no Departamento da Defesa, que terá, para o ano fiscal de 2018, um reforço de US$ 80 bilhões. Para 2019, serão US$ 85 bilhões.
Em nota, o presidente do Comitê das Forças Armadas da Câmara, Mac Thornberry (R-TX), celebrou o resultado: “Por tempo demais nossas tropas foram reféns de outras agendas políticas… Esse acordo começa a reconstruir e restaurar o Exército da América. Foi aprovado, porque membros de ambos os partidos fizeram da nossa segurança e dos membros do nosso serviço militar uma prioridade”.
Acordo generoso
Esta versão eleva os gastos em até US$ 300 bilhões, além de suspender o teto da dívida por um ano – até pouco depois das midterms. No total, o acordo assinado por Trump no dia 9 elevou em até US$ 700 bilhões o teto das despesas discricionárias para 2018, e em até US$ 716 bilhões, para 2019.
O acordo incluiu, por exemplo, quase US$ 90 bilhões em ajuda para áreas afetadas por desastres naturais, como Texas, Flórida, Califórnia, Porto Rico e Ilhas Virgens Americanas. Em ano eleitoral, a dotação agradou a republicanos, como o senador republicano pela Flórida Marco Rubio (R-FL), e a democratas (73 representantes aprovaram o texto), que não conseguiram levar adiante suas demandas sobre o Daca e muitos têm eleitores nesses distritos. A medida serviu para esvaziar a orientação dada (sem muito ímpeto, é verdade) pela líder da minoria na Câmara, Nancy Pelosi (D-CA), e seguida pelo Congressional Hispanic Caucus de votar contra o acordo.
Diferentemente do que ocorreu em janeiro passado e na administração Barack Obama, desta vez, tratou-se de um shutdown de menos de seis horas, com uma solução breve em um prazo também curto, para financiar o governo apenas até 23 de março. Depois disso, os congressistas dos Comitês de Dotações Orçamentárias do Senado e da Câmara precisam chegar a um novo acordo sobre o montante de US$ 1,3 trilhão que custeará o governo federal até 30 de setembro.
O que acontece no shutdown
De um modo geral, o governo mantém em funcionamento apenas suas atividades essenciais e paralisa as demais, podendo haver diferenças de uma administração para outra sobre o que é considerado prioritário. Todas as operações de Segurança Nacional costumam funcionar, com os efetivos das Forças Armadas continuamente mobilizados no curto prazo. Funcionários de outras pastas – Departamento da Justiça, ou de Segurança Interna, por exemplo – que trabalhem em áreas ligadas à Segurança Nacional também estão excluídos do shutdown. No governo Obama, por exemplo, o turismo foi particularmente afetado, com o fechamento de parques nacionais e de monumentos turísticos em todo país.
Rejeição do House Freedom Caucus
Destoando da maioria republicana, os cerca de 30 membros do House Freedom Caucus decidiram rejeitar o acordo-tampão irritados com o aumento dos gastos e dos déficits. Para o presidente dessa bancada à extrema direita do GOP, o representante Mark Meadows (R-NC), “a liderança republicana cedeu. O pântano venceu, e o contribuinte americano perdeu”. A frase foi reproduzida à exaustão por outros membros do grupo em vários programas de televisão e em declarações a jornais.
A expressão não é à toa. Remete a uma abstrata promessa amplamente alardeada por Trump durante a campanha eleitoral de 2016: a de que ele seria, como um autointitulado outsider da política, capaz de “drenar o pântano” que todo establishment de Washington havia-se tornado, nas palavras do então candidato.
Protesto solitário
“Eu quero que as pessoas se sintam desconfortáveis” de votar a favor de grandes déficits, explicou o senador Rand Paul (R-KY), ao justificar o procedimento de obstrução que impediu a votação no Senado e levou à microparalisia do governo, quase na virada da madrugada.
Defensor de uma emenda que garantiria rígidos limites orçamentários ao projeto, o senador disse querer expor a ambiguidade de seus correligionários. “Como é que você foi contra os déficits do presidente Obama e agora é a favor dos déficits republicanos? Isso não é a própria definição de desonestidade intelectual? Eu não posso (…) apenas olhar para o lado porque meu partido agora é cúmplice dos déficits”, denunciou Paul, em plenária.