Vitória democrata no Alabama é derrota para Trump e Bannon
por Tatiana Teixeira
Em uma eleição especial monitorada dia a dia e com preocupação pela Casa Branca e pelo GOP, o democrata Doug Jones derrotou por estreita margem o republicano Roy Moore, em 12 de dezembro, na briga pela cadeira do Alabama no Senado, um dos mais vermelhos da federação. Jones fica até o final do mandato do agora procurador-geral, Jeff Sessions, que termina em janeiro de 2021. Há dois anos, o atual (e ainda) secretário de Justiça era reeleito com 97%.
Jones é o primeiro democrata a conquistar, desde 1992, uma vaga no Senado por esse reduto eleitoral sólida e tradicionalmente republicano do sudeste dos Estados Unidos. Na última disputa pela Casa Branca, em 2016, nesse mesmo estado, o então candidato republicano, Donald Trump, derrotou sua oponente democrata, a ex-secretária de Estado Hillary Clinton, por 62% a 34%.
Voto do Black Belt e dos subúrbios ricos
A vitória desse ex-procurador de Justiça de Birmingham foi garantida com pouco mais de 20 mil votos, totalizando 49,9% contra 48,4%. Com isso, cai a já diminuta vantagem do GOP no Senado para 2018, ficando em 51 contra 49 (47 democratas e dois independentes que costumam seguir a bancada democrata). Além de se beneficiar do frágil momento político do adversário, Jones contou com a adesão do eleitorado afro-americano (96% contra 4% para Moore), grupo no qual concentrou seus esforços na reta final. Três em cada dez eleitores afro-americanos foram votar em Jones. Essa participação é digna de nota, já que, nos Estados Unidos, eleições especiais e de meio de mandato costumam despertar pouco interesse da população. O eleitorado feminino também tendeu a votar em Jones.
Doug Jones ganhou notoriedade ao processar dois ex-membros do Ku Klux Klan, responsáveis por um ataque a bomba a uma igreja batista em Birmingham, em 1963. Quatro meninas negras morreram nessa tragédia que se tornou um dos marcos da história segregacionista do estado.
No caso do eleitorado branco (66% do total), a maioria (68%) escolheu Moore. Ainda assim, Jones recebeu boa parte dos votos das cidades e dos subúrbios mais abastados e com brancos com melhor nível educacional, o que já havia ocorrido na recente eleição na Virgínia (leia mais no OPEU). Embora o eleitor com esse perfil costume votar nos republicanos, a crescente rejeição a Trump pode ajudar a entender essa mudança.
Depois das últimas vitórias nas urnas e com a popularidade do presidente em queda (na casa dos 30%), recuperar o espaço perdido no Congresso não parece mais tão impossível aos olhos da cúpula democrata, que também intensifica os movimentos de seus possíveis presidenciáveis para 2020. Um deles, o senador afro-americano Cory Booker (D-NJ), participou dos últimos dias de campanha, ligando sua imagem a essa expressiva conquista democrata. Para o Senado em 2018, os democratas parecem ter boas chances no Arizona e em Nevada e terão de defender dez cadeiras de estados que votaram em Trump no ano passado.
‘Hora de seguir adiante’
Ainda recusando-se a aceitar a derrota, esse ex-presidente do Supremo Tribunal de Justiça do Alabama divulgou no dia 16 uma mensagem, em que questionou a validade da eleição. Além disso, Moore recorreu a uma lei estadual, segundo a qual deve haver recontagem dos votos, caso a diferença entre os dois candidatos seja de 0,5%, ou menos. A recontagem é improvável. Se for realizada, porém, não há indícios de alteração do resultado, que deve ser certificado entre 26 de dezembro e 3 de janeiro. Trump já reconheceu a vitória de Jones em um tuíte.
No programa “State of the Union”, da rede CNN, no dia 17, Jones declarou que está “pronto para ir adiante, (Moore) aceitando, ou não” e disposto a votar com os republicanos em determinadas questões. Infraestrutura seria uma delas.
Escândalo sexual derruba candidato
No início de novembro, ainda em campanha, Moore se viu envolvido em um escândalo de proporção e visibilidade midiática nacionais, após ser alvo de denúncias de que teria tido relações sexuais com adolescentes, quando estava na faixa dos 30. Moore negou todas as acusações e atacou as “fake news”. Junto com isso, também pesou sua retórica excessivamente inflamada contra homossexuais, muçulmanos e de tons racistas, entre outras declarações polêmicas. Acabou abandonado pelo partido, que pediu que retirasse sua candidatura, temendo ter sua imagem arranhada e com danos significativos e extensivos às midterms em 2018.
Em dezembro, o presidente do Comitê Nacional Republicano do Senado (NRSC, na sigla em inglês), senador Cory Gardner (R-CO), foi enfático: “Roy Moore nunca terá o apoio do comitê senatorial. Nunca vamos apoiá-lo. Não vamos endossá-lo. Não vou deixar isso acontecer”. O Comitê Nacional Republicano (RNC, na sigla em inglês) também se afastou do candidato.
Por sua derrota, Moore culpou o líder da maioria no Senado, o republicano Mitch McConnell (R-KY), que ficou ao lado de Luther Strange nas primárias e retirou seu apoio ao ex-juiz depois que o escândalo veio à tona no jornal The Washington Post. McConnell chegou a afirmar que, se eleito, o colega sofreria uma investigação da Comissão de Ética com a possibilidade de expulsão da Casa.
Trump e Bannon derrotados
Nas últimas semanas, no meio do caos, Roy Moore contou com o apoio de Donald Trump. Nas primárias, o presidente também apoiou Strange, que acabou preterido. São duas derrotas consecutivas relativamente na conta de Trump, o que pode acentuar as críticas internas ao magnata nova-iorquino – na tentativa de se descolar dele, de suas políticas e de seu estilo – e/ou aumentar as adesões a algo que ainda não chega a ser um movimento, mas ganha corpo: a revoada antitrumpista.
Além de Trump, outro grande derrotado nessa eleição foi o ex-estrategista da Casa Branca e editor do site Breitbart News, Steve Bannon. Um dos principais apoiadores de Moore, esse adepto da extrema direita americana usou a disputa no Alabama para marcar uma posição com a Casa Branca e com o partido e defender sua agenda ultraconservadora. Perdeu a aposta, mas pretende insistir em 2018. A base tradicional republicana agora culpa o “tóxico” Bannon pela perda da cadeira no Senado.