Eleição distrital na Geórgia fortalece Trump

Na terça-feira, 20 de junho, um pequeno distrito do estado da Geórgia foi alvo de intensa mobilização e ganhou destaque no cenário político nos Estados Unidos. A eleição realizada no 6º distrito Congressional da Geórgia foi palco de uma disputa mais ampla entre democratas e republicanos se desdobrando na campanha mais cara da história do país para uma eleição deste tipo: aproximadamente 55 milhões de dólares considerando os gastos dos candidatos e as doações de grupos externos.

Eleição mais cara da história

Os gastos do partido Democrata foram astronômicos para uma eleição distrital. Segundo reportagem do The New York Times, a campanha de John Ossof teve um custo de 23,6 milhões de dólares contra 4,5 milhões de dólares gastos na campanha de Karen Handel pelos republicanos. Apesar do investimento alto dos democratas, Handel venceu a disputa, recebendo 52% dos votos contra 48% de Ossof.

A convocação para a eleição especial teve por objetivo escolher um substituto para o deputado republicano e médico Tom Price que renunciou ao cargo para se unir à administração do governo Donald Trump. Price assume o posto máximo do Departamento da saúde, pasta que controla cerca de 1 trilhão de dólares do orçamento público norte-americano. Na audiência no Senado que confirmou sua nomeação (52 a 47), Price foi questionado pela bancada democrata sobre suas relações com empresas farmacêuticas, o que teria garantido rendimentos milionários ao novo secretário.

Apesar da disputa por uma única cadeira na Câmara dos Deputados não alterar o equilíbrio de poder entre os partidos, controlada pelos republicanos, os democratas apostaram alto por considerarem as repercussões de uma vitória no distrito para o cenário político nacional. A expectativa era que a derrota republicana na Geórgia reverberaria em Washington DC, ameaçando a agenda do governo Trump interrompida pelas recorrentes denúncias contra o presidente, além de facilitar o esforço democrata na sua tentativa de bloquear a aprovação da reforma da saúde que será votada no Senado em julho. Avaliava-se que um resultado favorável ao partido em uma região historicamente dominada por conservadores contribuiria significativamente para uma demonstração de força e uma vitória moral do partido derrotado nas eleições de novembro, abriria caminho para as eleições na Câmara em 2018 e evidenciaria o descontentamento de parte dos eleitores do partido sobre a atual administração da Casa Branca.

Avaliava-se também que uma eventual vitória democrata reforçaria a prevalência do partido no apoio entre eleitores de distritos com alto grau de formação educacional. Entre os 15 distritos com população com maior índice educacional, onde pelo menos metade dos adultos possuem graduação, apenas dois tiveram representantes do partido republicano eleitos: o 6º distrito na Geórgia e o distrito de Northern Virginia em Washington. Nas eleições presidenciais de 2016,Clinton saiu vitoriosa entre os eleitores com formação educacional mais elevada. A candidata recebeu 49% contra 44% de Trump entre os que possuem graduação. Os votos dos homens brancos sem formação educacional foram importantes para a vitória de Trump, pois neste grupo de eleitores, o atual presidente obteve 71% dos votos contra 23% de Hillary. Os democratas precisavam mostrar que podem competir e prevalecer em distritos com alto índice educacional e isto representaria o caminho mais promissor para alcançar a maioria na Casa nas eleições do próximo ano.

Estratégia arriscada

A estratégia democrata foi arriscada: como toda aposta alta, os custos podem ser igualmente altos com a derrota. A derrota teve impacto na imprensa e pode deixar sequelas nas ambições dos democratas de alcançar a maioria na casa em 2018.

A opção por buscar vitórias em distritos tradicionalmente conservadores sofre, portanto, um duro golpe. O partido já havia perdido as eleições especiais para a Câmara no Kansas e em Montana. Nesta terça-feira, perdeu na Carolina do Sul e agora na Geórgia. A eleição na Carolina do Sul não teve a mesma atenção nacional porque a oposição aos democratas se mostrava mais forte. A vitória do republicano Ralph Normal sobre Archie Parnell que recebeu 51,1% dos votos contra 47,9% do democrata, já era esperada considerando que o quinto distrito tem votado em peso a favor dos republicanos desde 2010.  O mesmo ocorreu nas eleições especiais anteriores. Em Montana, o republicano Greg Gianforte venceu o democrata Rob Quist com uma margem razoável de votos, 50,2% contra 44,1%. No Kansas o republicano Ron Estes venceu James Thompson com 52,5% contra 45,7%. A vitória dos republicanos era certa, considerando que Trump obteve 27 pontos no distrito.

O embate entre os partidos no sexto distrito da Geórgia seria mais equilibrado, tendo em vista que o presidente Trump venceu na região por apenas um ponto percentual. Ainda assim, seria um alvo difícil de alcançar se considerarmos que o distrito é controlado pelos republicanos há pelo menos 40 anos. Mesmo com tais dificuldades, a derrota na Geórgia foi um duro golpe para os democratas que esperavam derrotar os republicanos como reflexo das insatisfações dos eleitores diante da administração Trump.

Sub-representação feminina

A eleição congressional mais cara da história dos Estados Unidos elegeu a primeira mulher do partido republicano para representar a Geórgia no Congresso. Com a entrada de Handel, o Congresso terá 105 mulheres ocupando a cadeira na casa. Este é o maior número de representação feminina no legislativo, mas está longe de ser o ideal. As mulheres seguem sub-representadas na política norte-americana e o número de congressistas corresponde a apenas 19.6% do total no Congresso.

A sub-representação das mulheres nos Estados Unidos é sintomática de um país que está bem atrás em termos de equidade de gênero. O país ocoupa o 45º lugar no ranking geral de equidade de gênero, e, se considerarmos a participação política das mulheres, o país cai para o 73ª lugar de 144 países. Mesmo influenciando de forma significativa a escolha dos candidatos, elas ainda continuam sub-representadas e enfrentam barreiras para assumir posições de liderança na esfera pública.

Em seu discurso de vitória, Karen lembrou que seu ingresso no legislativo representa um  marco histórico. Entretanto, não há tantos motivos para comemorar. Ela é a primeira mulher entre o partido republicano a assumir o cargo, mas o partido democrata já elegeu cinco mulheres para representar o estado da Geórgia no Congresso e a escolha pela republicana foi uma opção conservadora. Isto porque a candidata eleita é hostil às pautas vinculadas aos direitos das mulheres e embora o aumento número de mulheres na política norte-americana seja desejável para alcançar maior equidade de gênero em termos de representação, sua pauta não é alinhada à esta luta.

Karen Handel mencionou muito pouco o presidente Trump durante sua campanha e buscou não atrelar sua imagem à controversa atuação do presidente na Casa Branca. Ainda assim, o presidente sai fortalecido. Poderá respirar com mais tranquilidade sabendo que ainda mantém o apoio dos eleitores em locais tradicionalmente republicanos, mesmo com baixos índices de aprovação, e pode também se beneficiar deste clima para conseguir a aprovação das reformas da saúde e tributárias na Câmara.

por Débora F. M. Prado (IERI-UU) e Filipe Mendonça (IERI-UFU)

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