A recuperação nos EUA: lenta, constante e cada vez mais robusta

Panorama EUA, vol. 3, no. 5, junho de 2013

por Carolina Loução Preto

Nos últimos meses, a melhora em diversos indicadores econômicos nos EUA tem fortalecido a visão de que a recuperação da crise financeira de 2007 é cada vez mais certa. Durante o primeiro semestre do ano, o mercado imobiliário deu sinais de aquecimento, a criação de empregos superou as previsões de economistas e o mercado de ações atingiu altas históricas. Pesquisas recentes apontam para o aumento do otimismo em relação à economia, enquanto dados do Departamento de Comércio indicam expansão do consumo. Além disso, o cenário econômico parece estar resistindo aos cortes nos gastos públicos e ao aumento de impostos que tiveram início esse ano. A economia cresceu a uma taxa anualizada de 2,4% no primeiro trimestre de 2013, movida principalmente pelo consumo.

O ritmo da recuperação econômica tem sido acompanhado de perto pelos mercados. Parte dos analistas considera precipitadas as avaliações otimistas. Em particular, há apreensão sobre a continuidade das políticas de afrouxamento monetário do Federal Reserve (Fed). Desde setembro do ano passado, o banco central compra mensalmente US$ 40 bilhões em ativos lastreados em hipotecas e outros US$ 45 bilhões em títulos públicos de longo prazo. O programa de relaxamento quantitativo, que está em sua terceira rodada desde 2008, tem como objetivo aumentar a liquidez do mercado e, juntamente com a política de juros de longo prazo próximos a zero do banco, estimular o crédito e o crescimento econômico.

Em maio, o presidente do Fed sinalizou que o órgão poderia começar a reduzir as compras de ativos a partir das próximas reuniões do Federal Open Market Committee (FOMC). Ben Bernanke vinha afirmando que as taxas de juros de curto prazo serão mantidas perto de zero até que o índice de desemprego caia para 6,5% e a inflação não supere 2,5%. Como a melhora da economia e do mercado de trabalho são condições para que a política seja alterada, investidores têm observado atentamente os dados econômicos sobre os EUA diante das dúvidas sobre os próximos passos do banco. Nas últimas semanas, declarações de membros do FOMC e a divulgação de indicadores econômicos positivos reforçaram expectativas de que as injeções de liquidez começarão a ser reduzidas nos próximos meses, causando agitação no mercado financeiro. Os indicativos que têm pautado as análises do Fed e as interpretações positivas a respeito da recuperação da economia nos EUA serão discutidos a seguir.

Melhora do mercado de trabalho

Em junho, o Departamento do Trabalho divulgou o relatório mensal sobre as condições do mercado de trabalho em maio. Foram criadas 175 mil vagas durante o mês, número ligeiramente superior ao previsto por analistas. A taxa de desemprego sazonalmente ajustada subiu para 7,6% no mês passado. Os economistas, entretanto, atribuíram o aumento de 0,1% em relação ao índice de abril a fatores positivos. Houve aumento da força de trabalho, calculada pelo número de pessoas procurando emprego. Uma parcela menor dos desempregados tem desistido da busca, e muitos deles decidiram retomar a procura por vagas, o que é visto como sinal de otimismo.

O relatório sugere que cortes nos gastos do governo federal, incluindo os que afetam o setor de defesa, e um crescimento externo reduzido têm comprometido o mercado de trabalho. A demanda pelas exportações dos EUA, por exemplo, diminuiu, assim como as encomendas feitas a empresas de defesa. O governo federal foi responsável por 14 mil demissões e a indústria por 8 mil. Esse foi o terceiro mês de cortes nos segmentos.

A taxa de desemprego do país, que estava próxima de 10% em 2010, vem caindo, embora o ritmo da melhora tenha sido lento. Em agosto de 2012, mês anterior ao reinício do programa do Fed, o índice era de 8,1%. Estudos, entretanto, apontam que se considerarmos a taxa de emprego em relação à população, uma metodologia que não é afetada pela participação da força de trabalho, o índice dos últimos três anos se manteve perto dos níveis apresentados durante a crise.

De acordo com o Departamento do Trabalho, 11,7 milhões de pessoas estão desempregadas nos EUA atualmente. Analistas mais cautelosos ressaltam que quase 40% delas estão sem trabalho por 6 meses ou mais, o que afeta negativamente as chances de recolocação no mercado. Além disso, destaca-se que parte das novas contratações é temporária ou envolve postos de trabalho com baixos salários. Os novos empregos têm menor capacidade de estimular o consumo e o crescimento econômico do que as ocupações de maior remuneração, que foram perdidas durante a crise. Empregos em setores de menor remuneração como alimentação e comércio varejista, têm crescido com maior rapidez do que vagas de salários médios. A indústria ainda enfrenta dificuldades e tem ficado atrás na criação de empregos, com exceção dos fabricantes de automóveis, que foram beneficiados pelo aumento recente das vendas de veículos.

Enquanto o nível de contratações se mantém estável, os pedidos de auxílio desemprego caíram 6,5% desde janeiro. Durante a semana que se encerrou no dia 8 de junho, as solicitações caíram em 12 mil, atingindo334 mil, de acordo com dados sazonalmente ajustados. A previsão de economistas era de 350 mil. As informações divulgadas pelo Departamento do Trabalho é um termômetro do número de novas dispensas. As informações sugerem que as demissões estão retornando aos níveis pré-crise, o que pode estimular contratações.

Cerca de 4,5 milhões de pessoas recebiam o benefício até a semana que se encerra no dia 25 de maio, de acordo com as últimas estatísticas disponíveis. O número de beneficiários do auxílio caiu 29% no ano passado à medida que alguns encontraram empregos e outros receberam a assistência até o final do período permitido.

 
Fonte: The New York Time

Uma pesquisa divulgada, em junho, pela empresa de recursos humanos, Manpower Group, indica que o número de empregadores planejando fazer contratações no próximo trimestre é o maior desde 2008. No setor de construção, mais de 1 em cada 4 empregadores relataram ter a intenção de abrir vagas no trimestre que se inicia em julho. Segundo o estudo, entretanto, as empresas nos EUA ainda estão preocupadas com as economias europeia e chinesa, os custos do seguro saúde e outras incertezas.

Apesar da melhora, a velocidade de criação de vagas não tem sido suficiente para gerar uma queda rápida do desemprego. Segundo analistas, no ritmo atual, o país levaria cinco anos para atingir o nível de desemprego de antes do início da crise, em 2007.

Altas históricas no mercado de ações

O mercado de ações bateu recordes históricos durante a maior parte do ano. No início de maio, os três principais termômetros da Bolsa de Nova Iorque – os índices Dow Jones, S&P 500 e Nasdaq – apresentavam, em conjunto, uma alta de aproximadamente 13% em relação ao início de 2013. Na liderança da tendência, em maio, o Dow Jones apresentava alta de 15% no ano.

Em março, o índice superou pela primeira vez a marca histórica de 14.165,62 pontos, registrada em outubro de 2007, antes da eclosão da crise financeira. Desde então, o Dow Jones, que lista o valor médio das 30 maiores empresas dos EUA, bateu recordes consecutivos até o final de maio, quando começou a apresentar tendência de queda.

O S&P 500, indicador que reúne as 500 maiores companhias dos EUA, subiu 14% entre o início do ano e maio. O índice também superou, em março, sua marca histórica de 2007. Já o Nasdaq Composite, índice que concentra empresas de tecnologia e de inovação, cresceu 10% no mesmo período, embora ainda esteja longe de sua marca histórica.

Analistas afirmam que os mercados estão se recuperando das perdas da última crise, quando o Dow Jones chegou a 6.600 pontos, em março de 2009. Apesar das altas, os recordes são nominais, o que significa que o efeito da inflação não é considerado. Com atualização inflacionária, a alta recorde de março, por exemplo, ainda estaria em torno de 10% abaixo do nível de 2007.

De acordo com analistas, a política do Fed tem contribuído para as recentes altas do mercado de ações dos EUA. A manutenção de baixas taxas de juros tem reduzido o custo dos empréstimos, estimulando migrações de investimentos mais conservadores para as ações.

Recuperação do mercado imobiliário

Em maio, o Standard & Poor’s/Case Shiller, índice que mede o preço dos imóveis em 20 cidades dos EUA, divulgou que, o valor médio das propriedades subiu 10,9% em relação ao ano anterior. Este foi o maior crescimento registrado em quase sete anos. No mesmo período, o indicador para 10 cidades do país teve alta de 10,3% e o índice nacional registrou aumento de 10,2%. Segundo analistas, os preços estão voltando aos níveis de 2003, mas permanecem cerca de 28% abaixo do pico de 2006.

Outros dados reforçam a visão de que o mercado imobiliário, que há pouco tempo era visto como um dos obstáculos para a recuperação, está melhorando. As solicitações de permissões para novas construções e a venda de imóveis cresceram no último ano. Em março, as construções de novas casas e apartamentos superaram 1 milhão, pela primeira vez desde junho de 2008. Já os pedidos de licença para obras alcançaram 941 mil no mês de abril, atingindo o maior nível dos últimos cinco anos.

De acordo com economistas, a cobrança de taxas hipotecárias menores, devido à política de juros baixos do Fed, e a criação contínua de empregos têm estimulado a compra de imóveis. O aumento da demanda pelas propriedades, associada a uma oferta pequena, estimulou o crescimento dos preços e encorajou novas construções.

Analistas, entretanto, ressaltam que investidores e bancos têm motivado parte do aumento nos preços. Empresas compram uma grande quantidade de imóveis a preços reduzidos – sobretudo nas áreas mais afetadas pela crise – com o objetivo de alugar ou vender posteriormente a valores mais altos. Além disso, instituições financeiras que possuem inúmeras propriedades executadas devido à falta de pagamento das hipotecas têm optado por não disponibilizar parte dos imóveis para venda. As práticas reduzem a oferta, gerando aumento dos preços.

Para os mais cautelosos, o mercado imobiliário depende muito de compras desse tipo de investidor e continua sendo difícil para as pessoas que querem adquirir sua primeira casa. Segundo esses analistas, os crescimentos da renda, do poder aquisitivo e do crédito não têm acompanhado o ritmo de valorização dos imóveis. Devido ao desemprego ainda elevado e a ganhos salariais reduzidos, muitas famílias não podem obter os empréstimos necessários, mesmo em um contexto de baixa taxa de juro. Nesse sentido, o aumento dos preços de imóveis não seria o indício mais apropriado de uma melhora geral do cenário econômico.

Otimismo e expansão do consumo

Em maio, as vendas no comércio e serviços de alimentação bateram expectativas e subiram 0,6% em comparação ao mês anterior. O número representa um crescimento de 4,3% em relação ao mesmo mês de 2012. Os dados publicados pelo Departamento do Comércio, em junho, indicam que os consumidores têm resistido a pressões como aumento de impostos e cortes de gastos públicos, e podem impulsionar a economia no final do ano.  O consumo, que representa cerca de 70% da demanda do país, foi o maior motor de crescimento no início do ano.

Além disso, o think tank The Conference Board relatou crescimento de seu índice de confiança na economia para 76,2% em maio, nível mais alto desde fevereiro de 2008. A divulgação dos dados, que superaram as previsões de economistas, é acompanhada porque tem impacto no consumo. Apesar disso, críticos não consideram o nível de otimismo uma evidência sólida de recuperação econômica, devido à subjetividade das percepções.

A recessão de 2007-2009 causou a maior contração da economia desde a Depressão da década de 30. Oficialmente, a recuperação econômica teve início em meados de 2009. O PIB do país tem apresentado crescimento contínuo desde então, embora tenha desacelerado em 2011. Entre a segunda metade de 2009 e o fim de 2010, a taxa de crescimento real foi 2,5% ao ano. Em 2011, o número caiu para 1,8% ao ano. Parte dos economistas afirma que a recuperação tem sido mais fraca do que o esperado para um cenário pós-crise e teme que, sem políticas de estímulo, o país fique abaixo do nível de crescimento anterior a 2008.

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